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29/10/2018
19/08/2017
13/05/2015
:( :)...
“Lucílio, a quem Horácio considera o verdadeiro criador (inventor) da sátira, foi o primeiro a circunscrever explicitamente o seu público ao círculo de amigos escolhidos, deixando de fora tanto o que hoje se chama o «grande público», como os eruditos (Horácio faz depois o mesmo, no seu tempo). Quer dizer: esta poesia a que se chama sátira atingiu então o nó da sua função estética e da sua intenção formal: dar prazer aos amigos e chatear os inimigos, assim mais ou menos diz Lucílio. Lucílio não está nada interessado em agradar às massas (que mudam como o vento), muito menos em influenciá-las: por isso considera p. ex. a tragédia como pura psicagogia.”
Alberto Pimenta, “A Musa Anti-Pombalina”, pp. 10-11, A Regra do Jogo Edições, Lx, 1982.
Alberto Pimenta, “A Musa Anti-Pombalina”, pp. 10-11, A Regra do Jogo Edições, Lx, 1982.
25/03/2014
...
“Aristóteles
fala de poesia sublime e vulgar, e esta oposição, explicitada sobretudo na
oposição tragédia/comédia, reflecte desde início a organização social nas suas
duas classes: a classe dos senhores, voltada para cima, onde normalmente é a
residência dos deuses, e a classe dos servos voltada para baixo, onde
normalmente é o trabalho e a produção. Enquanto a tragédia representa a
reverência perante a ordem que vem de cima a comédia ocupa-se da ‘baixa humanidade’.
O facto de as tragédias terem sido proibidas muito mais raramente que as
comédias está ligado à própria propensão destas para transgredir os limites do
papel ético-social das classes oprimidas. Não é só o desfecho que distingue radicalmente
este dois géneros e está a priori
fixado, mas também a construção e a intenção. Em termos claros e evidentes,
poderiam reduzir-se os dois géneros às seguintes combinações: se há senhores
logrados por deuses ou por outros
senhores é trágico; se há servos logrados por servos ou por senhores é cómico;
as restantes combinações estão fora do âmbito do sistema poetológico.
Pelo século XVIII, este estado de coisas começou a
desagregar-se, dentro do processo geral de desagregação de toda a estrutura da
sociedade antiga, que se baseava numa ‘razão’ transcendente e não racional e,
menos ainda, existencial. Esta libertação da arte literária da transcendência absoluta
dos estilos e dos géneros faz portanto parte da libertação da consciência
operada ao longo do processo da revolução burguesa.
Acontece, porém, que esta quebra de estrutura social libertou
não só o produtor de arte literária como também o seu consumidor, o público;
formou-se por essa época um novo público, naif no que toca ao conhecimento da técnica literária
tradicional, interessado no consumo e assimilação de um novo tipo de arte,
menos complexa e cifrada, mais espontânea e posta naturalmente ao serviço dos
seus específicos interesses de classe, reais ou ideais.”
Alberto Pimenta in “O Silêncio dos Poetas”, pp. 21-23, Edições
A Regra do Jogo, Lisboa, 1978.
26/08/2013
...
14
sobre a expulsão do ditador islâmico
há a dizer o seguinte
os políticos ocidentais
como sempre inspirados
mobilizaram as suas redes sociais
sempre inpirados pela Epístola I
de S. Paulo aos Romanos
a salvação de Deus
será enviada aos
gentios
e eles a entenderão,
28, 28
ajudaram
outros islamitas
a revoltar-se
e a expulsar o ditador
o dono do café Farol
no porto do Suez
queixa-se desde então
«julgam que podem
fazer o que querem
agora até às raparigas
fazem o que está mal
já nem sequer hiyab
a tapar
a sem-vergonha»
Walid o muezim
e os amigos
fazem ronda nocturna
vão de moto
em demanda do mal
Walid
esfaqueou Ahmed
quando o viu
beijar a namorada
num recanto do parque
e Ahmed reagiu
aos insultos
ora graças a deus
esfaquear já não parece tão mal
como a bárbara lapidação
ainda desconhecem
outros castigos simples
que não oferecem dificuldade
o método por exemplo
que os jovens católicos
usaram no Porto
para eliminar Gisberta
a herege
Alberto Pimenta, in “de nada”, pp.43-44, ed. Boca, 2012.
18/06/2013
...
o labirintodonte
o labirintodonte
não é uma ave
de emigração
como o porfirião.
nem um
mamífero petulante
como o elefante
nem um
réptil repelente
como a serpente.
o labirintodonte
anda de pé
como o
chimpanzé
e o saguí
e é o pretendente
de
la vache qui rit.
é um bicho
de seu natural pensativo
pois precisa
de pensar
para saber
que está vivo.
passa por mim aquele poemático que diz eu
sou o senhor dos gritos passa a galope ope ope ope
leva a musa no lombo e a musa leva nos al
forges um bombo
eu pus a minha musa no cavalo de pau e só de
longe a longe é que vou por trás a musa le
vanta-se um bocadinho e eu com o de
dinho vejo se tem ovo
pró menino papar todo
Alberto Pimenta
20/02/2013
«Pimenta à frente, e nus traseiros!... (*)»
(*) Foi a exclamação que tive ao deparar-me com o anúncio da nova exposição do Museu Leopoldo em Viena d'Austria... Após de há uns tempos atrás ter lido o poema do Alberto Pimenta que aqui reproduzo.
6
chama-se Tim
o homem
em exposição no museu
e adormece
depois do intervalo
do almoço
acorda-o
o vigilante
há um potencial comprador
que o quer ver
e ele acorda e
estende a língua
mas o interessado
não quer a língua
manda baixar as calças
quer ver o acabamento
da tatuagem das costas
que por morte do homem
é o que está à venda
com a pele das ditas
assim reza o contrato
talvez hoje ainda não
amanhã poderão ser milhões
para os artistas
Tim
o que forneceu
e Wim
o que adquiriu
grande gesto
aquela tela viva
que agora expõe no
L’
ouvre
mas ouvre o quê
a arte abriu
nos graffiti das cavernas
como abre
nos muros de hoje
nos museus
estão bens
da economia financeira
nem âme vivante
se além da pele
abrirem a cabeça destes dois
encontram um neuromealheiro
em forma de neuroporca
recém-parida
está bem
a arte de museu
foi até há pouco
carne à venda
por que não há-de sê-lo
outra vez
Alberto Pimenta,
“De Nada”, pp28-29, Boca – palavras que alimentam,
Lda., 2012.
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info da expo:
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16/02/2013
Sena dizia: a «Poetaria»...
cinco
poetria
sempre a poetria
a delicada hora da poetria
de preferência antes de jantar
porque a seguir
poetria bebe do fino
e depois às vezes
não sabe o que diz
de qualquer modo
a poetria
a que embala
as donas de casa
e tem banca no templo
ou vice-versa
essa
faz parte dos ciclos
menstruais nacionais
até o ministério gosta dela
porque ela é boa
doce como o porco e
trata as alterações biológicas
como coisa do espírito santo
quem aprecia congelados
tem ainda o festival
da poetria
pode-se vir
há muitas disputas
em directo
e também em playback
ah
aquela vida de artista
solene e graciosa
viajando com a mala
cheiinha de poetria
e de mash-ups
mais um grande festival
promete muitos rabos e orelhas
alguém disse uma vez
que a poetria está a anos-luz
que é uma supernova
quer dizer
brilha muito
aos olhos de todos
mas na verdade
já não existe
de facto ela
ainda dá ares de existir
meia moribunda
porque a sua função
era ampliar o mundo
não
reduzi-lo ao tamanho de cromos
não
não é uma supernova
tem a vida artificialmente prolongada
o que nos momentos próprios
chegou a fazer faísca
agora só faz bocejar
como andar em topless
entre nudistas
tal e qual queridos
adorais a valeta
a dos outros
a doença terminal
a dos outros
a loucura
a dos outros
daí a vossa melancolia de classe
a vosso medo de não ganhar
maior que a vossa tristeza de perder
a nós outros
o tempo
passa-nos por cima
a vocês
parece que não passa
fica em cima como o de Proust
o que costuma acontecer
nessa posição
é sabido
e é vossa conquista
se restassem deste mundo
só os livros de poesia
os arqueólogos mais tarde
pensariam
que neste tempo
não aconteceu nada
a não ser afiar os cabos das facas
as vossa leituras
são a ver o mar
mas a vossa poesia olha o mundo
como um ecrã de televisão
com um grande vazio de árvores
os pássaros quando aparecem
pousam no chão
com Schubert no ouvido
uma elegia
ao pássaro em cima do rochedo
podia vir a calhar
com os ecos uns dos outros
era bom
que o pássaro voasse
o problema é esse mesmo
ele não levanta voo
quando passar este tempo
de sombra total
do corpo e do espírito
vocês partirão
sem haver no cais
a despedir-se
nem terão já a quem acenar
com o vosso lenço de papel
manchado
de tinta de choco
o que nos divide é um véu espesso
não
não podemos ser amigos
Alberto Pimenta,
in “De Nada”, Boca
– palavras que alimentam Lda., pp. 73-76, 2012.
02/11/2012
ÀS VEZES, PARA VARIAR...
ÀS VEZES, PARA VARIAR, SÃO:
As autoridades que erguem as nádegas
para lhes serem metidas moedas na ranhura.
Os deputados que apostam na comercialização
dos guardas-republicanos.
Os investidores que justificam
a força do uso com a força da usa.
Os magistrados que apoiam a democracia em
público e o cão-polícia em particular.
Os militares que empunham o facho-éclair
para fazer luz sobre o assunto.
Os tecnocratas que manipulam os dados
com os dedos e os dedos com os dados.
Os psiquiatras que ajudam os cães a com
pensar o seu complexo anal e vice-versa.
Os mestres que erguem a voz para dizer
quais as vozes que se devem ouvir.
Os escritores que zelam por que aquilo que é
proibido se torne obrigatório e vice-versa.
Os funcionários públicos que encaminham as
almas para o sétimo selo.
Os sacerdotes que recebem as colheitas com
a colecta anual.
Os internados no manicómio que dão
peidos que abalam a (so) ci (e) dade.
Os jornalistas que digerem este mundo e o outro
porque têm dentes fora e dentro.
O povo que se refere às conquistas de
abril.
Os polícias de choque que empacotam
as bombas e explodem.
Alberto Pimenta, “A Visita do Papa”, pp. 6-7, &etc,
Lisboa, 1982.
25/10/2012
02/03/2012
L's...
“Ana, salvé! Salvé, mas mesmo aí em Londres
não sei se você estará a salvo, porque aí também os
deve haver com certeza. Onde é que os não há? An-
dam no meio de nós, e acho que já são tantos que
nem sei se não seria melhor dizer que nós é que an-
damos no meio deles!”
“Ah, Alberto, como você tem razão! Elles estão
de facto em toda a parte e por aqui também os há só
que, com o frio, e sobretudo com a chuva, elles retra-
em-se mais. Quer dizer, elles retraem mais os apên-
dices, e os caudais, esses, então nunca se vêem, a não ser
num excepcional dia de sol ou nalgum surto de
exibicionismo de parque.”
03/11/2011
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