A Extração da Pedra da Loucura, Hieronymus Bosch |
O JOÃO TOLO
Havia uma mãe que tinha um
filho, que era muito tolo.
Um dia a mãe mandou o filho
lavar umas tripas no mar. As tripas eram muitas, e viu um navio ao longe, que
ia fazer uma viagem. Começou a chamar com um pano branco na mão.
O navio aproximou-se, e os
homens que vinham dentro perguntaram-lhe para que era que ele tinha chamado.
Ele disse-lhes que era para lhe ajudarem a lavar as tripas. Eles deram-lhe uma
grande sova e disseram-lhe que ele devia dizer “Boa viagem! Boa viagem!”.
Ele foi para casa, disse à mãe o
que lhe tinha sucedido. A mãe disse-lhe que ele devia dizer “Haja sangue! Haja
sangue!”
O tolo foi uma vez pela estrada
adiante, e entrou numa igreja, onde se estava a celebrar um casamento.
Ele pôs-se à porta e disse:
– Haja sangue! Haja Sangue!
E o noivo, ouvindo dizer isto,
pegou num cacete para lhe dar uma coça, e o tolo fugiu, e o noivo disse-lhe que
devia dizer “Sejam felizes! Sejam felizes!”.
Foi outra vez por uma estrada
adiante e viu um enterro numa igreja. Pôs-se a dançar, a cantar e a dizer:
– Sejam felizes! Sejam felizes!
Um convidado aborreceu-se daquele barulho, veio cá fora com um pau,
deu-lhe uma cacetada e disse-lhe que ele devia ajoelhar-se e rezar.
Ele foi para casa e disse à mãe tudo. A mãe disse-lhe que ele devia
rezar.
No dia seguinte viu um burro a dormir. Ajoelhou-se ao pé dele e rezou
por muito tempo.
Veio para casa e disse à mãe o que tinha feito. A mãe disse-lhe que,
quando visse o burro a dormir, que lhe espetasse uma faca.
No dia seguinte viu um homem a dormir e disse:
– Deixa, que vou fazer o que a minha mãe me disse.
Puxou de uma navalha e enterrou-lha no
peito. Dizendo à mãe o que tinha feito, a mãe, para não ter mais desgostos,
meteu-o num hospital de doidos, onde morreu.
Conto Popular
Português coligido por Tito Cardoso e Cunha in Fenda/ Magazine Frenética Nº5, Fenda
Edições, Coimbra, 1982.