“Seria
um homem que caminhava à minha frente? Nos povos que vivem nus, tal
como com os animais, a diferença entre os sexos é bem menos
evidente que nos nossos climas. Nós acentuamos a fraqueza da mulher
poupando-a a esforços, ou seja, às ocasiões de evolução, e
moldamos a mulher segundo um padrão ideal de graciosidade.
No
Taiti, o ar da floresta ou do mar fortifica todos os pulmões, alarga
todos os ombros, todas as ancas, e o cascalho da praia não poupa nem
homens nem mulheres. Estas fazem os mesmos trabalhos que eles e estes
possuem a indolência delas: elas têm qualquer coisa de viril e eles
algo de feminino. Essa semelhança entre os dois sexos facilita as
relações, torna perfeitamente pura a nudez perpétua, eliminando
dos costumes qualquer ideia de desconhecido, de privilégios
misteriosos, imprevistos ou furtos felizes – todo aquele abandono
sádico, todas aquelas cores vergonhosas e furtivas do amor junto dos
civilizados.
Porquê
essa atenuação das diferenças entre os dois sexos, que, nos
«selvagens», fazendo do homem e da mulher tanto amigos como
amantes, afasta deles a própria noção de vício, de súbito a
evocava um velho civilizado, com o terrível prestígio do novo, do
desconhecido?”
Paul
Gauguin,
“Noa-Noa – Estada em Taiti”, pp. 48-49, Publicações
Europa-América, 1998. Trad. Jacqueline Medeiros.