18/01/2023
01/11/2022
14/10/2022
11/10/2022
18/08/2022
Feira do Livro do Porto...
28/06/2022
Feira do Livro da Maia...
17/05/2022
08/05/2022
25/04/2022
10/04/2022
28/03/2022
Novidade 50kg...
11/02/2022
02/02/2022
26/01/2022
24/01/2022
...
"A sua pena! Ela ali estava, inútil e abandonada, como a clava de Hércules após a realização dos doze trabalhos portentosos.
Era o galho de uma roseira, cortado no jardim, e que, aparado tôscamente a canivete, tinha o aparo seguro com várias linhas de coser. Era aquela a pena de Teófilo - a formidável pena que produziria dezenas e dezenas de trabalhos cheios de erudição.Antes de cegar, o infatigável Teófilo chegava a escrever durante dez horas seguidas, enchendo enormes quartos de papel, dum e doutro lado, com a sua caligrafia miúda, tão fina e irregular.
Quando imaginava qualquer novo trabalho, carregava para junto da mesa tudo o que pudesse relacionar-se com o assunto a tratar. E, uma vez assim instalado, começava a escrever, a escrever ràpidamente, atirando para o chão as fôlhas numeradas, que depois juntava com facilidade.
Trabalhava a qualquer hora do dia ou da noite. Quando lhe acorria uma idéia, ou lhe contavam um pormenor curioso que pudesse interessar uma obra embrionária, tomava logo nota em pequenos verbetes que depois guardava em pastas exclusivamente destinadas a cada assunto.
Quando julgava ter os elementos bastantes para a organização do trabalho a realizar, passava, nessa altura, o seu cérebro a ser o ovário fecundo, onde tudo aquilo tomava forma, vida e vigor. Em casa, na rua, no curto espaço de tempo destinado às refeições, e até no leito o seu pensamento não deixava um só instante que fôsse de incidir sôbre a realização do trabalho em projecto."
Gomes Monteiro, "Vencidos da Vida" pp.118-119. Ed. Romano Torres, Lisboa, 1944.
13/01/2022
03/01/2022
07/11/2021
03/11/2021
01/11/2021
19/09/2021
20/08/2021
06/08/2021
...
29/06/2021
Feira do livro da Maia... de 3 a 12 de Julho... Fórum Maia junto à Biblioteca
De 2 a 14 de Julho a Livraria Edições 50kg estará encerrada na rua Faria Guimarães porque estará a participar nesta feira.
27/06/2021
20/03/2021
10/03/2021
24/02/2021
25/12/2020
...
13/12/2020
01/12/2020
29/11/2020
01/11/2020
04/09/2020
26/08/2020
13/08/2020
...
"Volta-se para mim o Fernando, e com aquelle ar obstinado que caracterisa o seu bello, resoluto espirito de trabalhador e de combatente, diz, pouco mais ou menos, isto:
- Publicando o nosso pensamento. Alarguemos o circulo da nossa intimidade; fallemos a quem quizer lêr; inspiremo-nos no ideal do nosso tempo - a Perfeição pela Liberdade; integremos a Arte no Progresso. Talvez isso seja util para os outros, como o é, decerto, para nós. Livremo-nos do convivio litterario, com a sua gente suspeita. Ponhamos de parte os merdas; vamos fallar a almas.
*Ha vinte e quatro horas que esta resolução foi tomada. Julgo-a rasoavel. Homens da penna, querendo intervir, realisamos essa intervenção com a penna. É esse o campo de batalha do escriptor que, como homem de acção, tem o seu logar reservado em todos os combates.
Estou só. Penso muito a frio. Essa resolução, hei de mantel-a.
Estou farto d'isto, - d'esta gente e até de mim. Provei cenaculos de taboletas generosas: houve charlatães que me illudiram como um papalvo, com os seus meritos de papelão apregoados como prodigios e as suas consciencias de lama doiradas de adjectivos; fallaram-me em apostolado, em insurreição, n'uma Humanidade a redimir entre cantos... Esta revolta, mesmo cochichada, breve se abandonou, e no 《lendemain》, trahido o proprio cerebro por um pataco, já o povo repugnava e a multidão era odiosa.
Alguem que lê isto sabe que não minto, e juro que sinto vergonha, por ter sido logrado por uma certa geração, cem vezes mais estupida do que eu. É isso que eu nunca me perdoarei, e o que faz com que me aborreça de mim proprio, - isso, e os dias que passo sem um grito nem um protesto. "
Fernando Reis - Mayer Garção, "Os Vermelhos - notas de dois refractários, Publicação Quinzenal, nr. 1, pp. 8-9, Lisboa, 1897
07/08/2020
...
06/08/2020
...
02/08/2020
14/07/2020
...
12/07/2020
...
11/07/2020
...
Para guerreiros com ambições a títulos associados à corte, escrever era essencial para interagir com a nobreza de elite e com o clero. Contudo, não devemos pensar na poesia no sentido moderno do termo: como uma actividade de lazer, um passatempo sem outra função que não fosse tecer comentários sobre a sociedade contemporânea. A poesia, no Japão pré-moderno, podia ser usada para comentar acontecimentos correntes, mas, mais importante que isso, a poesia demonstrava o próprio conhecimento da literatura chinesa e japonesa. Escrever bem, em termos de conteúdo e de forma - a caligrafia também interessa -, era um meio de os nobres de Quioto ascenderem profissionalmente. O monje Jien trocava poesias com Yoritomo, o que deu origem a uma relação mutuamente benéfica; Jien precisava de garantir direitos para as suas terras, e Yoritomo queria obter informações através dele. As pessoas também escreviam poesia juntas, como uma actividade social, associando poemas entre si; um cavaleiro de elite podia ser exposto à humilhação pública se não conseguisse escrever devidamente."
Michael Wert, Samurais - Uma história concisa, pp. 66-67, Esfera dos Livros, Lx, 2020.
09/07/2020
...
04/07/2020
...
27/06/2020
...
DIZIA UM
Meu lunfa, lalau azarado está aqui. Fiz um otário com cinco giripócas, dois enforcados e um abobrão; depois mandei a chuca de uma coroa, que só tinha uns picholés, mas um James Bond estava na minha cola e, quando eu quis fazer o esquinaço, fui guindado. O tiruncho me tacou o bracelete e eu fui falar com o majurengo. Positão. Entrei no flagra. O papa-gente, na metralhadora, era uma coisa.
Resultado: Águas de Carandiru, meu irmão da ôpa.
DIZIA O OUTRO
Tu és um vagau pé de chinelo. O bonzão aqui, só mete a mão em combuca, por um pororó leguete; nem sou do espianto, nem do escruncho, nem do atraque. Meu negócio é tomar na maciota. Sou vigário linha da frente, meu chapa.
Os estácios entram na minha, fácil, fácil. O meu pla é gostoso. E até hoje não caí do cavalo.
Manja essa. Larguei o violino na mão do judeu do brexó, que me passou às mães, um arame firme; depois deixei a guitarra com o portuga do buraco quente, que abonou o papai com mil cruzeirão.
Como tu vê, tou largando a minha brasa, na praça, e não vou entrar, caindo do burro.
Para mim, na tiragem só dá ôlho de vidro.
E O OUTRO
Pois eu, meu chaporeba, sou da marijuana. Fatura horrores ali no lixão. Numa só pavuna eu marreto vários pacáus, e cada fininho vale um Santos Dumont. Os tiras estão sempre de olofotes, mas o vivaldino tem vagólio na campana.
Até hoje, só puxei uma, na casa do cão. Foi quando a Excelência me tacou três anos de galera e dois de medida.
Mas agora estou na libertina e o negócio é levantar uma nota traficando a xibaba e, se os cherloques meterem uma escama em cima, tá na cara; um vai amanhecer com a bôca cheia de formiga.
Morou?
Ziriguidum pra você.
O OUTRO AINDA
Estás por fora, ó ligação. Vou salivar. Cruzei com uma mina e quase entrei de gaiato.
Apanhei meu pé de borracha e fui sassaricar pela aí. Tirei linha com uma ragaza e ela gamou na hora. Se mandamos pro esquisito. O hotel das estrêlas tava legal às pampas. Bitoca vai, bitoca vem, tu já se mancou, né? Mas na hora da onça beber água, lá se vem os mega de cara comprida. Positório. Partimos pruma candonga, que não foi bolinho, não. No meio da confusa a muxaxa deu o pirolito e o vagolino aqui, teve de se rebolar, porque os cavaleiros da meganha entraram firmes de rabo de galo.
A dança de rato engrossou. Dei uma na tampa do milico, que o escamoso ainda está rodando; depois me arranquei no caranguejo e recebi uma chuva de azeitonas quentes; quase me queimaram as antenas.
Meu liga, enfrentar a raça não é mole, não.
DEPOIS O OUTRO
Vê se te manca, ó migué. Pra mim êsse papo é furado. Se quiseres um papo firme, mora na minha: Eu já puxei um môfo. Já fui, várias vezes cidadão Carandiru. Nunca fui da moleza. Meu negócio era tomar na marra, e nunca dei arrêglo a tira ravêsso. Já topei cada dança de rato de fechar o tempo. Arribite estourou na minha telha que nem pipocas no tacho. Quase me vestiram o camisolão.
Mas hoje tou no cachimbo da paz. Tou limpo com os homens. Dou um duro lavando cavalo cego, pra dar uma papa de bom pra minha cachanga e os cagasebo.
Larguei mão de ser vago-mestre. Pendurei as chuteiras."
Felisbelo da Silva, "Dicionário de Gíria dos Marginais". Editora Prelúdio, São Paulo, s/d.
25/05/2020
...
19/05/2020
...
18/05/2020
...
05/05/2020
...
22/04/2020
...
31/03/2020
...
"Quase todos os viajantes que no século XVIII escreveram sobre os costumes em Portugal mencionam a natural familiaridade dos portugueses - e das portuguesas em especial - com os piolhos. Talvez a estranheza manifestada provenha mais da 'catança' que todos faziam sem qualquer rebuço ou ocultação do que propriamente da existência desses parasitas nas cabeças de homens, mulheres e crianças. Ora tal profusão desses insectos não era exclusiva dos portugueses. No que respeitava à nobreza e à burguesia ela provinha do uso das cabeleiras nos homens e dos penteados nas mulheres, e em toda a Europa se usavam cabeleiras e tais penteados, certamente com os mesmos riscos. As cabeleiras eram caras e quem as podia ter em número suficiente para as substituir, a fim de serem tratadas, acumulava as condições de criação dos insectos; os penteados das mulheres, pela quantidade de polvilhos, de pomadas e de postiços, penteados que se não desmanchavam todas as noites, cabeleiras que se não lavavam, faziam de cada cabeça um caldo de cultura. Por isso o italiano Vittorelli escrevia satiricamente: "A senhora alimenta no seu topete um batalhão secreto e é tal a quantidade de habitantes que muitos se tornam cavaleiros andantes." Portanto, o que acontecia aos portugueses da nobreza e da burguesia era o que, em maior ou menor escala, sucedia em toda a Europa e especialmente nos países do Sul, mais quentes.
Quanto às classes populares, independentes das modas mas sujeitas aos costumes, a devastação dos insectos fazia-se moderadamente, pois era crença comum que o piolho 'limpava' o sangue. A 'catança', em uso tanto nas classes mais elevadas como nas classes populares, era, ao mesmo tempo, uma operação de saneamento e de voluptuosidade."
Castelo Branco Chaves, "Os livros de viagens em Portugal no Século XVIII e a sua Projecção Europeia, pp. 38-39, Instituto de Cultura Portuguesa, 1977.
20/03/2020
..
Acatando as medidas de contenção que a DGS apela para fazer face ao surto do novo corona vírus, a Livraria Edições 50kg opta por privilegiar a venda de livros através dos meios digitais e a respectiva distribuição pelo correio com os portes oferecidos para o território nacional. Durante este período incerto estarei na livraria, no horário habitual, apenas a executar trabalhos de encadernação. Saúde e cumprimentos a todos. Obrigado.
Rui Azevedo Ribeiro.
Instagram: #livrariaedicoes50kg
06/03/2020
...
"A minha vida foi tão extraordinariamente infeliz que não podia acabar como a da maioria dos desgraçados. Quando se ler este papel, eu estarei gozando a minha primeira hora de repouso. Não deixo nada. Deixo um exemplo. "
Camilo Castelo Branco, 22 de Novembro de 1886.
06/02/2020
...
02/02/2020
...
01/02/2020
...
![]() |
«O Regicídio» por Alberto de Sousa |
30/01/2020
...
"TEORIA ECONÓMICA
Qual pesa mais: metade de um frango vivo ou metade de um frango morto, perguntou-me à queima-roupa. Metade de um frango vivo, respondi, após breve reflexão, explicando que o frango morto ainda que não tivesse sido degolado, sangrado e depenado, estaria por certo desidratado. E logo um sorriso sagaz a coroar de erro a minha resposta: entendo perfeitamente o raciocínio, diga-me apenas onde encontrar metade de um frango vivo para confirmar a teoria."
Jorge Roque, "Cão Celeste nr. 3", pág. 13, Maio de 2013.
29/01/2020
...
...a venda do carvão fazia-se por pesos: pesos de metal (pedra), outro carvão e dor. Toda a loja negra era sempre mais fria que o exterior. Até na neve, até na noite a loja arrefecia os de dentro. Mais fria: empedrado de um chão negro de pós soltos, e a poeira na sala mesmo cheia. Preta. Iluminada (dia ou noite). Preta. Mesmo. Armários poucos. Ou um só. E nesse armário a tentação de um género novo, o das lixívias, dos detergentes, do sal e porventura da farinha. Brancuras.
O importante era haver branco. Nem todo o negro, nem todo ele de carvão, nem tudo nunca. O branco lavaria mesmo que a si mesmo na esterilidade de ninguém jamais vir a comprâ-lo. Branco imortal, mesmo. Pós do branco.
Nos limiares passava uma cigana (1). De freguesoa. Ir e comprar, saber os preços, pagar por tudo. Com ela a brancura do olhar aberto. Levava. Ninguém o notaria sem invejas, reacções várias. O múltiplo acidente da inveja desse olhar branco ardente da cigana. Ou do seu avental. Elegância. Ou do seu corpo versado. Elegância (2). Ou de mais. Do possível gerador da cigana, ao sol que houvesse.
Ora um dia a cigana excitou-os demais. O bastante para todos se porem a cortar nela, quando saiu compras feitas. Ela, 5 quilos de carvão bem pesado. Mais os atrasados de uma dívida, que de todo furtava à memória da carvoeira. E a patroa: que a casa dela é negra (e a patroa era apenas carvoeira, já se sabe...) que a porcaria assim, que a pestilência assado.
Só faltava e responderam, à inveja extante:
- Pois no que dizeis sobeja inveja, e falta o que na casa da cigana mais há, para não falar da Alma. A alegria (3)."
Álvaro Lapa, "Arco-íris - Cadernos de Ideias Literárias V", pp. 43-44, Outubro de 1978.
(1) 'L. De Vasconcellos diz com referência às mulheres ciganas que viu no Cadaval em 1887 e às que viu na feira de S. João em Évora em 1888 que são feíssimas. As que eu tenho visto eram feias, mas a imundície e os farrapos que as cobriam contribuíam sem dúvida para augmentar essa impressão. Mas outros observadores, entre os quaes algumas damas, dizem-me terem visto algumas (nas Caldas da Rainha, no Algarve, etc.) bonitas, uma ou outra até digna de ser bella. A belleza da cigana é porém de curta duração: pouco depois dos vinte annos desaparece-lhe o viço da mocidade. D'ahi em parte a causa da má impressão dos observadores, como L. de Vasconcellos'. (F. Adolpho Coelho, "Os ciganos de Portugal", ed. Imprensa Nacional, 1892; pág. 184).
(2) "Alguns dão saltos e pulos prodigiosos. Um correspondente de Barbacena conta que um, chamado Joaquim Canhoto, com dois pulos fez cair de um telhado uma navalha que lá tinham posto". (F. A. Coelho, ibid. pág. 185).
(3) "Fazem crer que um animal velho e cansado é vivo e bravo, pondo-lhes em cima a palma da mão, em que escondem uma agulha, com que o picam, para que pinoteie". (F. A. Coelho, ibid. pág. 204).
"Segundo uma informação, em tempo um cigano foi a Villa-Viçosa fallar ao paracho para lhe enterrar o pae, e como o padre lhe pedisse 2$400 réis, aquele cigano disse-lhe que vivo não valia o pae esse dinheiro, que não dava mais de 500 réis; e como o padre não se quiz satisfazer com tal offerta, o cigano marchou de noite com os seus, abandonando o cadáver insepulto na casa onde estavam". (F. A. Coelho, ibid. pág. 223).
28/01/2020
...
20/01/2020
...
Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!
Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos, mais limpinhos,
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...
- O meu porquinho-da-índia foi a minha primeira namorada.
Manuel Bandeira, "Antologia Poética ", pág. 64, Livraria José Olympio Editora, Rio de Janeiro, 1981.
18/01/2020
...
16/01/2020
...
Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e não foi.
Tosse, tosse, tosse.
Mandou chamar o médico:
- Diga trinta e três.
- Trinta e três... trinta e três... trinta e três...
- Respire.
.....................................................................
- O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo
e o pulmão direito infiltrado.
- Então, doutor, não é possível tentar o pneumo-
tórax?
- Não. A única coisa a fazer é tocar um tango
argentino.
Manuel Bandeira, "Antologia Poética", pp. 62-63, Livraria José Olympio Editora, Rio de Janeiro, 1981.
...
O francês, o inglês, o alemão que não podiam viajar liam livros de viagens. Assim, nas literaturas europeias setecentistas, com excepção das de língua portuguesa e castelhana, os livros de viagens abundavam e sucediam-se.
(...) Os filósofos e os enciclopedista aproveitavam os testemunhos dos viajantes em ilustração das suas teses e reforço dos seus argumentos, tendentes ao abalo dos princípios racionais em que a sociedade vivia organizada. A variedade de crenças, a multiplicidade de religiões, a diversidade moral, as diversas formas de governar e de os homens se constituírem em sociedades, o 'bom selvagem', ajudavam os filósofos a minar a Autoridade, consubstanciada na Igreja Católica e na instituição monárquica.
Neste crescente e cada vez mais amplo movimento literário, sob os signos do exotismo, da crítica e do ataque aos malefícios do obscurantismo do dogma e do Poder autoritário, começaram a destacar-se com particularidade os livros dedicados às jornadas e permanências na Península Ibérica.
No geral, os viajantes entravam em Espanha já com ideias preconcebidas. Vinham, por assim dizer, colher exemplos que confirmassem e ilustrassem as suas teses, todas elas anteriores à observação e à análise. Compunham assim o quadro de duas nações supersticiosas, fanáticas, atrasadas, bárbaras, e ridiculamente ignorantes, onde imperavam o clero e dois reis absolutos. Fiados em Voltaire, em Montesquieu, em D'Argens, em La Harpe, que nunca haviam passado os Pirinéus, confirmavam que para cá desses montes governavam a Inquisição e um clero ignaro dominava os reis e mantinha o fanatismo dos povos. Aqui, nos dois países da Espanha, mantinha-se praticamente íntegras a ordem que a autoridade real sustentava, a crença nos dogmas, o poder absoluto e a certa ciência dos monarcas - conjunto de alvos excelentes para os protestantes e para filósofos deístas ou simplesmente ateus. Na verdade, a maioria dos livros de viagens na Península que foram publicados no século XVIII participam dos dois combates que então se travavam na Europa: pela supremacia do Protestantismo, destacadamente nos três primeiros quartos do século; e pela abolição dos governos monárquicos absolutos, em particular no último quarto do século, sob inspiração maçónica."
Castelo Branco Chaves, "Os Livros de Viagens em Portugal no Século XVIII e a Sua Projecção Europeia", pp. 10-12, Biblioteca Breve, 1977.
15/01/2020
...
10/01/2020
...
Ruy Belo, "Na Senda da Poesia", pág. 69, União Gráfica, 1969.
09/01/2020
...
(...) Compram-se, muitas vezes com amizade, moeda mais forte que o dólar, críticos que digam bem. Leva-se a este domínio íntimo o velho princípio dos contratos: do ut des. Louvamos os outros para que nos louvem a nós. Fazemos-lhes favores para que, no momento oportuno, no--los façam a nós. O leitor raramente repara. Chama-lhe a atenção, na página literária, o anúncio de um livro, volta a encontrar uma referência ao mesmo na secção de crítica, solicita-o uma entrevista que talvez o próprio autor tenha redigido e, mal se descuida, entra-lhe pelos olhos dentro a fotografia que aparece não se sabe bem a propósito de quê. Negociam-se comercialmente valores humanos que até aqui o pudor velava. A publicidade instala-se na própria consciência. Há o perigo de que o escritor, ao ouvir e ver tudo aquilo, se convença, tão longe foi a cadeia, de que não é ele que se está a adular a si próprio
Tomará como crítica válida para a delimitação da sua capacidade aquilo que, iludido, diz aos seus próprios ouvidos, como quem não quer a coisa. Assim se perde uma actividade nobre, que permite a correção dos defeitos e garante, em última análise, a evolução, o crescimento, condição de vida."
Ruy Belo, "Na Senda da Poesia", pp. 67-68, União Gráfica, 1969.
...
- Diga lá, já agora.
Êxito, calcule. Não sabe como me ofendeu. Compreendi. Eu sei que, antes do lançamento de 'Dona Flor e seus dois maridos' Jorge Amado já tinha assegurados mil e quinhentos contos... Êxito, em vida, em Portugal?"
Ruy Belo, "Na Senda da Poesia", pp. 43-44, União Gráfica, 1969.