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04/02/2017

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Um duelo entre Antero de Quental e Ramalho Ortigão


Praça 9 de Abril, vulgo Jardim da Arca d'Água, na cidade do Porto. Quando o duelo ocorreu neste local, em 4 de fevereiro de 1866, o jardim ainda não existia (Foto: Nuno Carvalho)

«(...) Em 1865, depois de uma viagem a São Miguel, Antero [de Quental] regressa a Coimbra. Em Setembro desse ano, [António Feliciano de] Castilho escreve ao editor António Maria Pereira uma carta, que será publicada como posfácio do Poema da Mocidade, de Pinheiro Chagas. Nela, o velho poeta discute poemas de Antero de Quental, Teófilo Braga e Vieira de Castro, ironizando particularmente sobre as Odes Modernas e sobre dois poemas de Epopeia da Humanidade, de Teófilo Braga. Antero resolve descer à liça e contestar ao seu velho mestre o direito de se arvorar em árbitro das letras nacionais - faz publicar uma carta-aberta a Castilho, Bom-senso e Bom-gosto, onde, exaltadamente, se insurge contra o desdém de Castilho relativamente à nova geração de poetas. E desencadeia-se a que é talvez a mais famosa polémica literária portuguesa, conhecida por Questão Coimbrã ou Questão do Bom Senso e Bom Gosto (...)

No início de 1866, Ramalho Ortigão sai em defesa de Castilho com o folheto A Literatura de Hoje. Acusa Antero de cobardia, pois este invocara como argumentos a velhice e a cegueira do poeta:  [Escreve Antero] O caso era cómico e não trágico. Ramalho Ortigão escreveu insolências bastante indignas a meu respeito num folheto a propósito da sempiterna questão Castilho. Eu vim ao Porto para lhe dar porrada. Encontrei, porém, o Camilo [Castelo Branco] o qual me disse que adivinhava o motivo da viagem e que antes das vias de facto, ele iria falar com o homem para ele dar satisfação. Aceitei. A explicação, porém, do dito homem pareceu-me insuficiente e dispunha-me a correr as eventualidades da bofetada quando me veio dizer o Camilo que o homem se louvava em C.J.Vieira e Antero Albano com plenos poderes de decidir a coisa e que fizesse eu o mesmo em dois amigos meus; na certeza de que uns e outros seriam considerados padrinhos de um duelo (!) no caso de se não entenderem a bem... Que can-can!

No duelo, em 4 de Fevereiro, logo no primeiro assalto, Antero fere Ramalho num braço. A luta termina, as honras estão lavadas. Os dois escritores reconciliam-se. Diz Camilo: Em 1866 na belicosa cidade do Porto, defrontaram-se de espada nua dois escritores portugueses de muitas excelências literárias e grande pundonor. Correu algum sangue. Deu-se por entretida a curiosidade pública e satisfeita a honra convencional dos combatentes. Alguns dias volvidos ia eu de passeio na estrada de Braga e levava comigo a honrosa companhia de um cavalheiro que lustra entre os mais grados das províncias do Norte. No sítio da Mãe-de-Água apontei a direcção de um plano encoberto pelos pinhais e disse ao meu companheiro: Foi ali que há dias a «Crítica Portuguesa» esgrimiu com o «Ideal Alemão»! (...)»

Carlos Loures, in Antero de Quental, Vidas Lusófonas

retirado DAQUI

05/08/2011

Da América com amor...

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Nota: grafia antiga

“Vejamos porém o que nos diz Herbert Spencer[1] no seu Dialogo e no Discurso sobre os Americanos. Começa por louvar o enorme desenvolvimento da sua civilisação material: a grandeza e magnificiencia das suas cidades, o esplendor de Nova York; a actividade das gentes, o seu poder de trabalho, de invenção e de decisão; as suas riquezas mineira, a enormidade dos seus campos virgens e fertilíssimos. Nota depois que eles poderam lançar mão, e de facto lançaram, dos progressos realisados nas nações da Europa, corrigindo-lhe os defeitos e aproveitando a longa experiencia desses velhos paizes. Reconhece por fim que podem legitimamente aspirar a produzir, passado tempo, uma civilisação mais grandiosa do que todas as conhecidas até hoje. – Mas cita-lhes tambem a sua vida violenta, feita a alta pressão, a qual acarreta consigo os grandes desastres financeiros e produz o Surmenage, a incapacidade permanente e as correspondentes heranças para as gerações que se sucedem. Diz-lhes que o seu unico interesse está nos negocios, que esses são o fim superior de sua vida, e que eles se contrapõem naturalmente o enfado e a existência sem encantos. E condena o desprezo ilegítimo a que votam os seus competidores na luta desses negocios. Relativamente á politica, afirma e prova a intensa corrupção que lavra naquele paiz, a real negação da liberdade, a falta do respeito mutuo que faz a essência da vida ingleza, a luta tremenda, sem nobreza, dos interesses materiais. Numa sintese lapidar, o filosofo acaba por lhes aconselhar que substituam o poder intelectual pela beleza moral, e o desejo de serem admirados pelo de serem amados.”

Op. Cit in Antonio Arroyo, “A Viagem de Antero de Quental á America do Norte”, pp.67-69, Fac-smile da Estante Editora, 1992.



Herbert Spencer  (1820-1903)

02/08/2011

Se numa altercação alguém sobe o nível quando aquece...

   "Rara era a noite em que Antero e Germano não tinham uma discussão violentíssima que terminava duma forma sempre engraçada. Dormiam ambos no mesmo quarto e davam-se como irmãos (1). Chegados ao quarto, começavam conversando tranquilamente; mas a pouco e pouco iam perdendo a serenidade, já altercavam com calor. Do tu cá, tu lá, passavam ao você, até terminarem, no auge da contenda, em V. Exa. diz, faz ou acontece.

Nesse ponto intervinha João de Deus:
- Oh! menino, Oh! menino!...

Antero metia-se então na cama, apagava a luz e dizia sacudidamente:

- Boa noite.

E Germano, sentando-se á mesa, punha-se a encher linguados para o jornal.

Os seus temperamentos eram muito dessemelhantes. Antero ingenuo, leal e arrebatado; Germano por vezes aspero, mas sempre penetrante, e aproveitando cruamente as fraquezas ou ingenuidades do adversario. Entre o cajado de Antero e o florete de Germano, aparecia porém a Senhora da Graça, o João de Deus, a serenar os combatentes."

Antonio Arroyo in "A Viagem de Antero de Quental á America do Norte", pp.19-20, Fac-smile da Estante Editora, 1992.

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(1) As filhas de Germano Vieira de Meireles, como se sabe, foram herdeiras dos bens de Antero de Quental.