28/07/2019

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Gerês, 28 de Julho de 1945 Thomas Mann. Os Buddenbrooks. Um romance, sobretudo uma cultura. A propósito de uma tísica pulmonar ou de um negociante de cereais, este homem tem artes de nos meter num tal emaranhado de ideias, de conceitos, de cogitações, que a vida passa a ter não apenas o seu caudal de lances e de emoções, mas uma beleza maior, feita da fisiologia íntima do saber. Eu não sei se qualquer novela de terceira não terá mais vida física, muscular, um alento possìvelmente mais cotidiano e mais aliciante. Aquela declaração de amor da Montanha Mágica, feita através de uma radiografia, ou a descrição da febre tifóide, aqui, são flores que nascem de uma técnica literária magistral, mas, mais do que isso, de conhecimentos que hão-de sempre parecer-nos sagrados e secretos. Ai da humanidade quando de todo as suas pitonisas e os seus feiticeiros se forem! Com razão alguém chamou às artistas de cinema as deusas da nossa mitologia. Contudo, é um belo espectáculo ler um livro assim. Tem a gente a impressão de que toda a Grécia e toda a Europa se diluíram na caixa de compor da tipografia.

Miguel Torga, “Diário III”, pág. 109, 1954, Coimbra.

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