02/12/2018

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“Os sociólogos diziam que a neurose e a depressão eram reflexos da transformação cultural da sociedade ocidental no século XX. E que a neurose era o reflexo de uma sociedade em que dominavam a disciplina e a hierarquia e as proibições sociais e que se tratava de uma expressão patológica do sentimento de culpa. E que a depressão era uma expressão patológica do sentimento de impotência e da consciência do vazio. E que primeiro as pessoas ficavam neuróticas porque teriam gostado de fazer coisas proibidas mas não puderam porque eram proibidas e quando violaram a proibição sentiam-se culpadas. E mais tarde quando tudo era permitido começaram a ser depressivas porque não sabiam o que queriam no fundo fazer e transformaram-se em novos sujeitos patológicos e os psiquiatras diziam que o sujeito patológico tinha mudado completamente de figura. E os sociólogos diziam que a depressão era uma compensação para um mundo em que a liberdade individual já não representava um ideal a alcançar de forma dolorosa mas um obstáculo que devemos dolorosamente ultrapassar. E que a neurose era a angústia de violar as proibições e a depressão a angústia perante o peso da liberdade. E algumas pessoas queriam procurar em tudo algum sentido e padeciam de frustração existencial. E os psicólogos diziam que a procura do sentido da vida se deve à necessidade de expulsar dela o vazio e a morte e que isso permitia viver mais intensamente. E no final dos anos oitenta a Organização Mundial da Saúde emitiu uma declaração dizendo que a depressão era a patologia mais comum no mundo ocidental. Mas dos Estados Unidos da América começaram a infiltrar-se na Europa novas proibições sociais por exemplo que não se deve fumar ou abusar do sal ou contar piadas sobre homossexuais ou viver ociosamente etc.”

Patrik Ouředník, “Europeana – uma breve história do século XX”, pp. 77-8, Antígona Editores Refractários, Lisboa, 2017.

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