“O
primeiro genocídio do século XX ocorreu na Turquia em 1915. O
Governo começou por prender e fuzilar seiscentas famílias arménias
que viviam em Constantinopla e depois desarmou e fuzilou os soldados
de origem arménia que prestavam serviço no exército turco. E todos
os arménios receberam ordens para abandonar as cidades e aldeias num
prazo de vinte e quatro ou quarenta e oito horas e o exército turco
ocupou posições junto das portas da cidade e quando as pessoas
saíram fuzilou todos os homens e mandou as mulheres e crianças para
o degredo em regiões desérticas na Mesopotâmia. E as mulheres e
crianças tiveram de percorrer de trezentos a quinhentos quilómetros
a pé sem comida e a maioria pereceu. E os Franceses e os Ingleses e
os Russos apresentarem uma nota de protesto em que pela primeira vez
na história se escrevia tratar-se de um crime contra a humanidade. E
um oficial alemão que nessa altura estava com o exército turco como
instrutor levou para a Alemanha sessenta e seis fotografias do
genocídio arménio e enviou-as ao imperador alemão e escreveu-lhe
que a Alemanha haveria de escolher melhor os seus aliados porque a
vergonha da Turquia não deixava de manchar também a Alemanha. E
entre 1928 e 1949 os Russos deportaram seis milhões de cidadãos de
nacionalidade suspeita arménios e lituanos e ucranianos e polacos e
alemães e moldavos e gregos e calmucos e curdos e inguches etc. e 30
por cento deles pereceram pelo caminho e 20 por cento morreram no ano
seguinte. Os comunistas diziam mais tarde que não se tinha tratado
de deportações mas de optimização do espaço geográfico e do
primeiro passo rumo a uma nova sociedade supranacional onde já não
teria importância quem vivia onde mas quão afincadamente trabalhava
para o bem de todos. E em 1934 inventaram uma reserva para os Judeus
e convidaram todos os judeus soviéticos a mudarem-se para lá. A
reserva encontrava-se na fronteira com a China na região de
Khabarovka e no Inverno a temperatura descia até aos -40º C e os
comunistas diziam que não era uma reserva mas uma região autónoma
onde os Judeus podiam estar entre os seus e gerir a sua própria
vida. E em 1944 deportaram para o Cazaquistão e para o Quirguistão
477 mil chechenos em 12525 vagões para o transporte de gado e 190
mil chechenos morreram pelo caminho de fome e gelo e em 1999
inventaram para os chechenos suspeitos campos especiais denominados
campos de desterro temporário. E em 1948 acusaram jornalistas e
médicos e engenheiros de origem judia de cosmopolitismo e de uma
mentalidade burguesa e mandaram assassinar a maioria deles e mandaram
outros para campos de concentração. O número de vítimas do
genocídio arménio foi estimado em um milhão a milhão e meio mas
os Turcos diziam que o genocídio arménio não tinha sido um
verdadeiro genocídio e a maioria dos Judeus assim pensavam também.”
Patrik
Ouředník,
“Europeana – uma breve história do século XX”, pp. 45-47,
Antígona Editores Refractários, Lisboa, 2017.
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