CODA
Lê os poetas mortos meu filho
os que não desesperam por repetirem tudo
os perdidos no sentido já só resíduos disso
os já completamente mortos
Lê-os por fora
de dentro dos teus gestos todos e duma só vez
que eles é que estão mais perto das estrelas
e esquece os vivos troca-lhes mesmo os nomes que importa
Toma os versos destes por sombras d’alguma coisa
(que poderás nunca vir a saber o que seja)
nos teus gestos Toma
este verso morto
Dá-se o nome de luz à sombra da luz viva
E repete-o Dá-se o
nome de luz à sombra
Da luz viva Em todas
as suas variantes
Contra quem mortos e vivos te sair ao caminho
Que os vivos resistem muito a morrer
sempre à procura de como se possui a vida
até que dão de si e morrem
É então que vivem
Lê-nos na passada e devolve-nos (ide à vida, diz) forte
como no ténis a bolsa ao sportsman do outro lado
que só não marcará com fraude se não puder
Mas contudo lê-nos
Escuta-nos como a quaisquer
outros que procuram sempre um ouro qualquer sob a vida
Também nós não sabemos (vemos ouvimos e lemos)
sentindo que o ouro nunca achado nos mata enquanto
cresces
O drama é estarmos
sempre cada vez mais perto
A um metro e vinte de profundidade
na luz zebrada do fundo azul da piscina
abri a boca para respirar e foi logo este
país todo que me sufoca e não soube porquê
Na esplanada bebendo água fresca o mistério
continuaria
Carlos Leite in ‘O Desflashar dos Espaços’, pp.43-44,
Black Sun Editores, Lx, 1987.
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