"Um corpo é para endoidecer
não se habita em paz
nem pertence a
é sozinho
sala vazia de hospício
caiada de branco
funcional
asséptica
feita à medida de um doente
mental"
Rui Caeiro in «Baba de Caracol», 2ªed, Língua Morta, p.22, Lisboa, 2010.
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"Aos poetas não invejar coisíssima nenhuma: a poesia que
fazem, a inspiração que podem ou o mau vinho que bebem. Nem
as vidas que tiveram, por muito adjectivadas ou descoloridas que
fossem. Nada. Pois tudo é para esquecer: os versos, a inspiração,
os alcoóis e, já agora, as vidas também. E a somar a isso as dores
que sentiram, depreende-se que muitas e também os alívios,
desde os mais nobres até aos mais soezes, ou vice-versa."
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"14
Carta para A.
viste que os dias não passavam
disto, e viste bem. desse lado
do céu, tens o melhor miradouro
sobre a madrugada. se encontrares
o pintainho que sepultámos,
em segredo e lágrimas, no
quintal das tias, pede-lhe o
arco da sua asa nas noites de lua nova.
remete-me, quando puderes,
pacotes de chuva miúda, gosto
de a ver decalcar a terra, fundir-se
com as sementes de milho
no canto da achadinha.
entretanto, vou montando o
telescópio, com as instruções
que me deste. põe-te à vista
e combinamos um gelado a
meio caminho,
à hora da infância."
Renata Correia Botelho, in «Avulsos, por causa», Língua Morta, p.20, Lisboa, 2010.
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