05/05/2019

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Coimbra, 5 de Maio de 1947 Esta rapariguinha vem transtornada de Fátima. Tudo a deslumbrou. A multidão, o espectáculo e o lugar. Sobretudo o lugar. Sentiu verdadeiramente que havia nele qualquer coisa de sobrenatural, de divino.
E eu, então, falei-lhe de Roma. Contei-lhe que tanta emoção se sentia nas Catacumbas, como no Coliseu, como debaixo de um arco de triunfo. E visse o despropósito: nas Catacumbas, tinham vivido cristãos; no Coliseu tinham lutado gladiadores com feras; e sob o arco do triunfo tinham passado tiranos.
– Concebo a sua fé, e respeito-a, – acrescentei. – Mas para que um sítio qualquer fique carregado de uma electricidade emotiva, não é preciso que Deus ou a sua Mãe venham cá a baixo. O homem é muito capaz de uma façanha destas. Basta que um pastor ou um bispo se resolvam a criar um mito. Então, as pedras transformam-se em altares, e uma mangedoira no berço mágico de um redentor.

Miguel Torga, “Diário IV”, pág. 35, 1953, Coimbra.

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