“Gerez,
8 de Setembro de 1942 – Passeio no jardim botânico. Cedros,
acácias, palmeiras, eucaliptos, e tudo me pareceu mais ou menos bem.
Mas de repente surgiu qualquer coisa a perturbar a harmonia. Vi
melhor, e era uma Ginkgo Biloba, que estava ali, trémula, delicada,
aflita, como uma deusa verdadeira num templo falso de exposição.
Aterrei-me. Sou assim: diante de uma bananeira, duma araucária, ou
de qualquer outra planta assim quente e distante, sinto-me em paz. No
meu sangue, os Incas, os Aztecas, os Guaranis, os Hotentotes, os
Senegaleses, e todas as outras raças de que a história seiscentista
reza, estão de facto conquistadas. Mas, com respeito aos Japoneses,
sinto que o tiro do Zeimoto não chegou. Por isso, sempre que me
aparece diante dos olhos um leque ou uma árvore assim, a sugerir
outra arquitectura, outra música, outra pintura e outra alma, é
como se visse o demónio em pessoa diante de mim.”
Miguel
Torga, “Diário
II” 3ª ed. Revista, pp. 64-65, Coimbra Editora, 1960.
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