Monte
Real, Agosto de 1938, Terça –
Que
tristeza isto de a gente escrever! Secos como paus na vida, e sai-nos
depois a ternura pelo bico da pena! Comigo é assim. E como ninguém
me lê – ninguém dos que eu mais desejava que recebessem ternura
de mim (minha Mãe, meu Pai, minha Irmã, uns pobres amigos rudes que
tenho na minha terra e uns infelizes que encontro por este mundo) –,
fica tudo em letra morta. Hoje todo eu fui uma sede ardente de
abraçar um infeliz que calcorreava às apalpadelas as ruas
escaroladas da Nazaré. Um dia como uma estrela, aquela maravilha ali
para se ver, e o desgraçado cego de nascença! Mas o abraço saiu-me
aqui, a tinta.
Miguel
Torga, “Diário I”, pp. 71-72, 1941, Coimbra.
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