(Óleo de Lou Albert-Lasard, 1916) |
“Já
disse? Aprendo a ver. Sim, estou a começar. Ainda vai mal. Mas vou
aproveitar o meu tempo.
Por
exemplo: que nunca tenha tido consciência de quantas caras há. Há
muitas pessoas, mas há ainda mais caras, pois cada uma tem várias.
Há pessoas que usam uma cara anos seguidos; gasta-se naturalmente,
suja-se, quebra nas rugas, alarga como luvas que se usaram em viagem.
Só as pessoas simples, poupadas; não mudam de cara, nem a mandam
lavar. Serve muito bem, afirmam elas, e quem é que lhes pode provar
o contrário? Mas perguntar-se-á: Se têm várias caras, que fazem
às outras? Guardam-nas. Serão para os filhos. Mas acontece também
os seus cães sairem com elas. E porque não? Uma cara é uma cara.”
Rainer
Maria Rilke, “Os
Cadernos de Malte Laurids Brigge”, pp.5-6, Ed. Instituto Alemão da
Universidade de Coimbra, 1954. Trad.
Paulo Quintela.
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