Questionário do jornalista Sérgio
Almeida (JN) e as respostas de Rui Azevedo Ribeiro (50kg).
(JN): Como diz o
A. Dasilva O, achas que a poesia voltou à trincheira, ou seja, voltou
a uma espécie de clandestinidade com edições restritas e artesanais? Vês essa
tendência com agrado ou nem por isso?
(50kg): Assumindo
uma totalidade (a poesia) mas sabendo bem que isso faz pouco sentido. Direi que
ela insiste em resistir! É uma situação parecida com aquelas ervinhas que
crescem entre os empedrados ou, o que é ainda mais bonito, as plantas que
nascem das paredes dos prédios porque as sementes foram juntas com o cimento. Porém,
julgo que ninguém duvida que, as condições para este protótipo de vida são
terríveis e uma luta constante contra variadíssimas adversidades. É certo que é
vida, mas é uma vida atrofiada e abaixo da sua potência. A trincheira não é um
lugar à qual dê gosto regressar. Se se está entrincheirado, é uma situação,
está-se a resistir e agrada-me que exista quem resiste. E a estar numa
trincheira que seja só com voluntários! Mas também quero dizer que não pode ser
apenas reacção. É preciso agir! Já chega de cavar trincheiras, cavar buracos, de
“fazer como o verme”. Vamos lá fazer ninhos para as metralhadoras!
(JN): 2 É possível detectar
pontos de contacto (linhas estéticas ou ideológicas) entre os nossos novos
poetas?
(50kg): Isso é
um assunto para a crítica se debruçar. Eu apenas pergunto porque é que não
existe crítica literária, porque a que há não é. Por que é que os Mídias só se
lembram da poesia quando é o dia dela calhar no calendário de todo o mundo! Ou
porquê que eu abrindo um jornal para ler ‘novas’ literárias – tenho a impressão
que trouxe por engano as promoções do supermercado. Quanto aos novos, o Paulo
Leminski escreveu: “(…) apenas o mesmo/ ovo de sempre/ choca o mesmo novo”. E
sendo assim, se o novo novo for igual a outro novo que se parece com aquele
outro novo perguntem se a chocadeira é do mesmo dono. Se for não fiquem
chocados! Sobre as linhas estéticas que as snifem os estetas. Quanto às
ideológicas, direi que não, os poetas ainda não se unem por ideias lógicas por
umas tantas ilógicas isso sim, já aconteceu! Ninguém sabe o que é o novo.
Repito, ninguém! Os que andam por aí a dizer: é novo!; é novíssimo! São os
vendedores da banha da cobra! E há muitos!
(JN): 3 Se tivesses que
destacar alguns nomes que se destacam desta geração, quais elegerias?
(50kg): Preferiria
dizer quais os que estacava mas apenas pelo receio de que este primeiro dia de
Primavera os puxe para enxertos não o faço! Se me permitirem não responderei. Acho
que esta pergunta é daquelas que contribuem para que o vórtice da pressa, do palavreado
e de uma série de “ah pois!” se instalem. Também não estou seguro que haja essa
coisa chamada geração, que não seja apenas um estarmos todos aqui e por um
período coincidimos nisso. Por que se falarmos de afinidades isso não faz muito
sentido, pois poderei ser mais “próximo” de um poeta satírico do séc. XVIII que
dos meus contemporâneos. No entanto gosto que haja grandes poetas árvores
ensimesmados (ou em-si-mimados) que tapem a luz do sol quase toda… Para que na
sua sombra haja deliciosos poetas trufas ou poetas cogumelos (hum!) e alguns
são bem venosos a destilar. Já a árvore ao sol parece ser só capaz de dar uma madeira
seca e quebradiça (não sei se servirá para palitos!)
(JN): 4 Apesar da escassez de
meios, a 50 kg tem publicado nomes de prestígio da poesia nacional. Esses
livros só são possíveis precisamente porque as editoras tradicionais se
desligaram da poesia?
(50kg): Não,
acho que as 50 kg e outros projectos similares teriam sempre um lugar, mesmo
que essas editoras fizessem um bom trabalho (ou apenas o seu trabalho). É certo
que continuaria a não ser edições populares. Continuariam a ter tiragens pequenas
e de circulação restrita e entraria no conceito de luxo ou do inglês “deluxe”.
Não se trataria de fazer públicos, mas antes para um público já devidamente
conhecedor e apreciador deste conceito artesanal e de rarefacção. O que é
estranho, é serem editoras como a 50kg a terem que fazer públicos. A lançarem e
a darem a conhecer autores sem que estes tenham qualquer possibilidade de chegarem
ao conhecimento do tal “grande público”. Por isso já parece uma mania destes autores
destas pequeníssimas editoras, de parecerem tão restritos, ou de culto... É que
se é obrigado a saltar por cima de uma série de etapas (olha um bom nome para
uma casa de tapas) e muitas das vezes o primeiro livro parece logo uma coisa de
luxuosa.
(JN): 5 Uma questão agora
como poeta: quais os traços que consideras fundamentais na tua poesia e em que
sentido estão ou não em convergência com o que se escreve e publica hoje?
Diverge convergindo
com os que divergem. O meu traço é na verdade uma traça. Traço-o traçando tudo!...
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