Alexandre Pinheiro Torres (1923-1999)
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A VIDA: ÚLTIMAS TEIMOSIAS
À carne são permitidos todos os desastres.
Esta oliveira segura ainda
os próprios intestinos com as mão. Nada
veio de súbito preveni-la do fim.
Mas não há noites totais. Na mais escura
o peixe do fundo do rio vem até à superfície
fazer sinais com o seu semáforo. Penso
no sorriso da deusa ausente acaso do Olimpo
quando o monje veio procurá-la. Uma deusa
de seios tão firmes que neles se poderia partir
um martelo de bronze. E o Olimpo ensopado pela
[urina
doutros poetas e doutros monjes mesmo assim de
[bexigas cheias.
Tu vês? A vida insiste em excesso para que sobre-
[vivamos:
emprenhar deusas! Uma luz intensamente
brilha. Sim! Brilha! Brilha! É uma oliveira
teimando em dar azeite até ao desastre.
Alexandre Pinheiro Torres in “A Flor Evaporada”, p.45, D. Quixote, Lx, 1984.
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OS NÁUFRAGOS
Os visitantes deixaram-se ficar até que o
soalho se tornou visível através
do tapete. E o que é mais: já não tinham
nada para dizer. As cabeças
tinham regressado a casa e as suas
línguas eram agora os polegares dos próprios
pés. Falavam para baixo mordendo a
carpete mordiam-na e ruminavam-na.
Alexandre Pinheiro Torres in “A Flor Evaporada”, p.51, D. Quixote, Lx, 1984.
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O MORTO: A FLOR DE SI
A única coisa certa sobre o morto
é que já foi senhorio de carne:
agora é perdê-la flor que se
evapora e sorrir até aos ossos.
Amarante, tarde e noite de 10 de Julho de 1983
Alexandre Pinheiro Torres in “A Flor Evaporada”, p.53, D. Quixote, Lx, 1984.
§ Científico-Cosmogónico-metafísico de Perseguição,1942 (ensaio)
§ Novo Génesis,1950 (poesia)
§ Quarteto para Instrumentos de Dor, 1950 (poesia)
§ A Voz Recuperada, 1953 (poesia)
§ Programa para o Concreto, 1966 (ensaio)
§ O Mundo em Equação, 1967 (ficção)
§ A Ilha do Desterro, 1968 (poesia)
§ A Terra de Meu Pai, 1972 (poesia)
§ Vida e Obra de José Gomes Ferreira, 1975 (ensaio)
§ O Neo-realismo Literário Português, 1977 (ensaio)
§ A Nau de Quixibá, 1977 (romance)
§ Os Romances de Alves Redol, 1979 (ensaio)
§ O Ressentimento de um Ocidental, 1981 (poesia)
§ A Flor Evaporada, 1984 (poesia)
§ Antologia da poesia brasileira do Padre Anchieta a João Cabral de Melo Neto, 1984 (antologia)
§ Contos, 1985 (romance)
§ Tubarões e Peixe Miúdo, 1986 (ficção)
§ Espingardas e Música Clássica, 1987 (ficção)
§ Antologia da Poesia Trovadoresca Galego-Portuguesa, 1987 (antologia)
§ Ensaios Escolhidos I, 1989 (ensaio)
§ Ensaios Escolhidos II, 1990 (ensaio)
§ O Adeus às Virgens, 1992 (romance)
§ Sou Toda Sua, Meu Guapo Cavaleiro, 1994 (ficção)
§ A Quarta Invasão Francesa, 1995 (romance)
§ Trocar de Século, 1995 (poesia)
§ A Ilha do Desterro, 1996 (poesia)
§ Vai Alta a Noite, 1997 (romance)
§ O Meu Anjo Catarina, 1998 (romance)
§ Amor, Só Amor, Tudo Amor, 1999 (romance)
§ A Paleta de Cesário Verde, 2003 (ensaio)
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