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20/01/2020

...

PORQUINHO-DA-ÍNDIA

Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!

Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos, mais limpinhos,
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...

- O meu porquinho-da-índia foi a minha primeira namorada.


Manuel Bandeira, "Antologia Poética ", pág. 64, Livraria José Olympio Editora, Rio de Janeiro, 1981.

16/01/2020

...

PNEUMOTÓRAX

Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e não foi.
Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico:
- Diga trinta e três.
- Trinta e três... trinta e três... trinta e três...
- Respire.
.....................................................................
- O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo
                            e o pulmão direito infiltrado.
- Então, doutor, não é possível tentar o pneumo-
                                                                     tórax?
- Não. A única coisa a fazer é tocar um tango
                                                              argentino.

Manuel Bandeira, "Antologia Poética", pp. 62-63, Livraria José Olympio Editora, Rio de Janeiro, 1981.

25/06/2015

«PROFUNDAMENTE»...

Quando ontem adormeci
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Estrondos de bombas luzes de Bengala
Vozes cantigas e risos
Ao pé das fogueiras acesas.

No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem risos
Apenas balões
Passavam errantes
Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
E riam
Ao pé das fogueiras acesas?

– Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente

Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci

Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos êles?

– Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.


Manuel Bandeira, “Poesias e Prosa”, págs. 210-211, vol. I, Editôra José Aguilar, Lda., Rio de Janeiro, 1958.

22/05/2015

Um 'bestiário' de Manuel Bandeira...

CHAMBRE VIDE

Petit chat blanc et gris
Reste encore dans la chambre
La nuit est si noire dehors
Et le silence pèse

Ce soir je crains la nuit
Petit chat frère du silence
Reste encore
Reste auprès de moi
Petit chat blanc et gris
Petit chat

La nuit pèse
Il n'y a pas de papillons de nuit
Où sont donc ces bêtes?
Les mouches dorment sur le fil de l'électricité
Je suis trop seul vivant dans cette chambre
Petit chat frère du silence
Reste à mes côtés
Car il faut que je sente la vie auprès de moi
Et c'est toi qui fais que la chambre n'est pas vide
Petit chat blanc et gris
Reste dans la chambre
Eveillé minutieux et lucide
Petit chat blanc et gris
Petit chat.

Petrópolis, 1992.

Manuel Bandeira, Obras Poéticas, 1ªed. Editorial Minerva, p.206, Lisboa, 1956.



ANDORINHA

Andorinha lá fora está dizendo:
– «Passei o dia à toa, à toa!»

Andorinha, andorinha, minha cantiga é mais triste!
Passei a vida à toa, à toa...

Manuel Bandeira, Obras Poéticas, 1ªed. Editorial Minerva, p.227, Lisboa, 1956.



MADRIGAL TÃO ENGRAÇADINHO

Teresa, você é a coisa mais bonita que eu vi até hoje
na minha vida, inclusive o porquinho-da-Índia que
me deram quando eu tinha seis anos.

Manuel Bandeira, Obras Poéticas, 1ªed. Editorial Minerva, p.230, Lisboa, 1956.