18/10/2019

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Tive de regressar a França. Deveres imperiosos de família chamavam-me.
Adeus, terra hospitaleira, terra deliciosa, pátria de liberdade e de beleza! Parto com mais dois anos, rejuvenescido vinte, mais bárbaro também do que à chegada e no entanto mais culto. Sim, os selvagens ensinaram-me muitas coisas, aqueles ignorantes, sobre a ciência de viver e a arte de ser feliz.
Quando deixei o cais, no momento de me fazer ao mar, olhei para Teura pela última vez. Tinha chorado durante várias noites. Agora, cansada e sempre triste mas calma, estava sentada sobre a pedra, com as pernas balouçando, tocando na água salgada com os seus pés grandes e sólidos. A flor que antes trazia atrás da orelha tinha-lhe caído sobre os joelhos, murcha.
Espaçadas, outras como ela olhavam, fatigadas, mudas, sem pensamentos, o pesado fumo do navio que nos levava a todos, amantes de um dia. E a ponte do navio, com os binóculos, durante muito tempo pareceu-nos ler nos seus lábios este velho discurso maori:
«Vós, brisas ligeiras do sul e do leste, que vos juntais para brincar e acariciar os meus cabelos, corram depressa para outra ilha: aí encontrareis aquele que me abandonou, sentado à sombra da sua árvore favorita. Digam-lhe que me viram chorar.»
PAUL GAUGUIN
1898”

Paul Gauguin, “Noa-Noa – Estada em Taiti”, pp. 115-116, Publicações Europa-América, 1998. Trad. Jacqueline Medeiros.

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