01/10/2013

A Extração da Pedra da Loucura, Hieronymus Bosch

O JOÃO TOLO

                Havia uma mãe que tinha um filho, que era muito tolo.
                Um dia a mãe mandou o filho lavar umas tripas no mar. As tripas eram muitas, e viu um navio ao longe, que ia fazer uma viagem. Começou a chamar com um pano branco na mão.
                O navio aproximou-se, e os homens que vinham dentro perguntaram-lhe para que era que ele tinha chamado. Ele disse-lhes que era para lhe ajudarem a lavar as tripas. Eles deram-lhe uma grande sova e disseram-lhe que ele devia dizer “Boa viagem! Boa viagem!”.
                Ele foi para casa, disse à mãe o que lhe tinha sucedido. A mãe disse-lhe que ele devia dizer “Haja sangue! Haja sangue!”
                O tolo foi uma vez pela estrada adiante, e entrou numa igreja, onde se estava a celebrar um casamento.
                Ele pôs-se à porta e disse:
                – Haja sangue! Haja Sangue!
                E o noivo, ouvindo dizer isto, pegou num cacete para lhe dar uma coça, e o tolo fugiu, e o noivo disse-lhe que devia dizer “Sejam felizes! Sejam felizes!”.
                Foi outra vez por uma estrada adiante e viu um enterro numa igreja. Pôs-se a dançar, a cantar e a dizer:
 – Sejam felizes! Sejam felizes!
Um convidado aborreceu-se daquele barulho, veio cá fora com um pau, deu-lhe uma cacetada e disse-lhe que ele devia ajoelhar-se e rezar.
Ele foi para casa e disse à mãe tudo. A mãe disse-lhe que ele devia rezar.
No dia seguinte viu um burro a dormir. Ajoelhou-se ao pé dele e rezou por muito tempo.
Veio para casa e disse à mãe o que tinha feito. A mãe disse-lhe que, quando visse o burro a dormir, que lhe espetasse uma faca.
No dia seguinte viu um homem a dormir e disse:
– Deixa, que vou fazer o que a minha mãe me disse.
Puxou de uma navalha e enterrou-lha no peito. Dizendo à mãe o que tinha feito, a mãe, para não ter mais desgostos, meteu-o num hospital de doidos, onde morreu.

Conto Popular Português coligido por Tito Cardoso e Cunha in Fenda/ Magazine Frenética Nº5, Fenda Edições, Coimbra, 1982.

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